Nos últimos anos, principalmente após a divulgação dos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), em 2007, detalhando a situação ambiental caótica do nosso planeta, o tema “meio ambiente” ganhou ampla visibilidade. Cada vez mais, consumidores estão em busca de produtos menos agressivos ao meio ambiente: alimentos orgânicos, lâmpadas econômicas, produtos de higiene e limpeza biodegradáveis.

Hoje já é possível substituir uma grande quantidade de produtos de uso diário por outros que respeitam mais o meio ambiente, desde suas matérias-primas — naturais ou recicladas — até seu processamento — como processos tecnológicos mais limpos e biotecnológicos não-transgênicos. O “ecologicamente correto” está na moda e ganha mais espaço nos lares e hábitos das famílias. Mesmo que sejam mais caros, como se constata em alguns casos, os bens e serviços focados na preservação da natureza começam a fazer parte das prioridades das pessoas mais exigentes (e mais conscientes).

O desenvolvimento de inovações tecnológicas desse tipo já é considerado uma alternativa econômica atraente para as empresas — tanto que fez emergir o lema “inovar para sustentar a empresa e o planeta”. Mas de acordo com Jacques Marcovitch, professor da Universidade de São Paulo (USP) e um dos estudiosos do tema com foco no crescimento econômico e na distribuição de renda, ainda falta no país uma cultura de inovação para a sustentabilidade. “A atividade de inovação do Brasil terá que se pautar por uma agenda internacional e fazer uma leitura de tendências”, afirma.

Ecologia industrial

Marcovitch aborda o tema “sustentabilidade” de uma maneira muito mais ampla do que a estritamente ambiental, alheia às questões sociais. Ele destaca as pandemias e a questão da segurança alimentar (e da fome) como barreiras ao desenvolvimento sustentável. “Precisa-mos de uma mudança radical na cultura e nos valores da empresa para incluir o tema da sustentabilidade”, destaca.

Apesar dos problemas sociais e da latente necessidade de inserção da preocupação ambiental na cultura inovativa, o cenário no Brasil é promissor: o país tem saído na frente com tecnologias “verdes”. Um bom destaque são as energias limpas, que têm projetado o Brasil mundialmente, principalmente por causa do desenvolvimento do etanol (o álcool polui menos do que a gasolina).

Para Marcovitch, o Brasil agiu de forma inovadora e sustentável ao investir em produção de etanol, mas nem por isso consegue disputar mercado nos Estados Unidos, que protegem o seu etanol à base de milho. “Porém, se a produção do etanol brasileiro não fosse limpa, estaríamos fornecendo mais um pretexto para que os países mais desenvolvidos mantivessem subsídios à produção interna do biocombustível”, explica.

Algumas empresas brasileiras e filiais de multinacionais já têm trabalhado com alta tecnologia em favor do meio ambiente. Mas é preciso lembrar que não existe no mundo uma empresa ou produto sustentável por si. “O que podemos dizer é que um processo produtivo ou um produto contribuiu ou não para a sustentabilidade do planeta”, explica o professor Biagio Fernando Giannetti, da Universidade Paulista (Unip), líder do Grupo de Estudos Físico-Química Teórica e Aplicada — que, dentre outros temas, estuda avaliação e aplicação de eco-indicadores para desenvolvimento sustentável e temas ligados à ecologia industrial. Ele acredita que as empresas estão de fato assumindo compromissos com o meio ambiente, mas que ainda falta o desenvolvimento de mecanismos para avaliar adequadamente esse processo.

Selo de garantia verde

Mesmo ações mais pontuais podem dar início a uma nova mentalidade e aos poucos ganhar densidade e adesão da população. Mas os especialistas lembram que é preciso criar mecanismos eficientes para mensurar o quanto novos produtos e processos produtivos estão, de fato, contribuindo para a manutenção do planeta. Os efeitos positivos das inovações e práticas sustentáveis já são alvo de uma série de formas de mensuração. Existem hoje, no mundo, diversos tipos de certificações e selos verdes para empresas comprometidas com a redução de impactos negativos ao meio ambiente. Alguns deles são de iniciativa dos governos e outros são de origem privada ou do terceiro setor.

Os selos verdes, que idealmente só devem ser aprovados após uma criteriosa avaliação de especialistas, são concedidos na União Européia, Japão, Estados Unidos, Austrália e mesmo na Colômbia. No Brasil, existem hoje selos verdes apenas para produtos da agricultura e pecuária orgânicas — certificados pelo IBD (Instituto Biodinâmico) — e para produtos de madeira — com certificação de florestas plantadas com plano de manejo sustentável pelo Conselho de Manejo Florestal (FSC – Forest Stewardship Council). Mas ainda não há uma legislação específica para orientar os procedimentos de certificação. Nos Estados Unidos, a ONG Green Seal é a concessora do mais importante selo verde. Na Europa, há mais de oito selos verdes, sendo o alemão Anjo Azul o mais antigo e respeitado.

Para atestar as construções ecológicas, o mais conhecido certificado no Brasil é o LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), conferido pelo Green Building Council Brasil, associado ao norte-americano U.S Green Building Council (USGBC). Ele permite a classificação em diversas categorias, segundo o grau de impacto relacionado, tanto para novos imóveis como para edificações mais antigas.

De acordo com o professor Gianetti, é preciso criar com urgência uma metodologia científica padronizada para avaliar os impactos ambientais de um processo produtivo — e, se possível, reduzi-los. “Uma empresa pode obter uma certificação de redução de emissão de CO2 na produção — e se promover com isso — sendo que o processo produtivo substituto pode ser muito mais poluente do que a emissão de CO2”, explica. Para ele, o consumidor vai ampliar suas ações respeitosas com o meio ambiente, e cobrar das empresas posturas mais conscientes. Mas algumas ações podem se desgastar com o tempo, quando visões mais abrangentes forem se impondo. Como, por exemplo, uma empresa anunciar que vai plantar árvores para contribuir para a sustentabilidade do planeta. “É bom plantar árvores, mas já se pensa numa perspectiva maior de mudança, como reduzir o desperdício e o consumo”, explica.

Nova perspectiva

A “mudança de perspectiva”, citada por Gianetti, porém, não parece tão simples. Kip Garland, da Seed Innovation, empresa de consultoria em inovação estratégica, garante que para se incluir o tema da sustentabilidade na agenda das empresas é preciso alterar o foco da inovação mudando as perguntas, e não as respostas (para os mesmos questionamentos de sempre). Ele exemplifica sua teoria com uma história bem simples: quando os homens ainda pensavam em como criar armas de caça mais eficientes, alguém pensou em caçar sem sair do lugar e criou a domesticação de animais. Isso foi uma mudança de perspectiva. “Hoje, ao invés de nos perguntarmos como fazer para nos transportarmos com energias mais limpas, devemos questionar por que estamos nos transportando tanto”. Para Garland, não basta pensar em novas formas de economizar energia mantendo o padrão vigente, é preciso mudar o padrão vigente (social, de trabalho etc).

No mesmo sentido, Günter Pauli, fundador e diretor da Zero Emissions Research and Initiatives (Fundação Zeri — rede de 3 mil estudiosos que buscam soluções criativas para problemas de indústrias), argumenta que é preciso pensar no processo de inovação para além do desenvolvimento de novos processos ou produtos em épocas de crise. “O processo inovativo deve ser constante e o foco na sustentabilidade deve fazer parte da cultura da inovação”, diz.

Pauli e Garland estiveram presentes na última reunião anual da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Ino-vadoras (Anpei), realizada em junho, que tratou do tema. Maria Ângela do Rêgo Barros, presidente da Anpei, diz que a escolha do tema é oportuna. Para ela, o equilíbrio ecológico depende da adoção imediata de práticas sustentáveis por todos os seres humanos, inclusive do setor produtivo. Isso significa que as ações em prol da sustentabilidade vão do cidadão comum às megacorporações e a todos os níveis de governo: “o lema deve ser economizar energia elétrica e água, reduzir a queima de combustíveis fósseis, evitar todo tipo de desperdício, reciclar tanto quanto possível e possibilitar que outros reciclem”, afirma a empresária.

Leia a matéria completa em:

Inovação e meio ambiente
Pressão verde motiva empresas a inovar de forma sustentável
Flávia Gouveia e Sabine Righetti

http://www.conhecimentoeinovacao.com.br/materia.php?id=329

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